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quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Transitar Portugal

"O caso de um aluno que passou de ano (o 8.º) com nove negativas despertou por aí certos queixumes. É vontade de dizer mal. Antes de mais, o aluno em causa não é uma excepção, é um exemplo: pelos vistos, "transitar" criancinhas com sete, oito, nove ou dez negativas já se tornou prática relativamente comum nas escolas nacionais. E o hábito não é tão negativo quanto aparenta. Muito pelo contrário, e por quatro razões.
Em primeiro lugar, acaba com a discriminação entre disciplinas. Até agora, inúmeros alunos saltitavam de ano em ano sem saberem nada de matemática. Agora, são livres de saltitar sem saberem nada de coisa nenhuma. Um ponto a favor da "interdisciplinaridade".Em segundo lugar, acaba com a discriminação entre os diferentes tipos de ensino. Se os frequentadores das Novas Oportunidades obtêm um diploma do 9º ou do 12º mediante a mera elaboração de uma redacção, num dialecto vagamente evocativo do português, sobre "O Mel" ou "As Minhas Férias" ou "O Magalhães", não há motivo para submeter os restantes usufrutuários do sistema educativo a exigências desumanas. Um ponto a favor da sistematização das "valências".
Em terceiro lugar, acaba com os traumas escusadamente infligidos às crianças. Por regra, os meninos e meninas corridos a nove negativas são criaturas sensíveis, que sofrem imenso com as sanções e que, frustradas, dedicam em consequência a vida à birra, à droga e ao pequeno crime. Um ponto a favor da segurança.
A quarta, e primordial, razão é que o fim das "retenções" acaba com alguns traumas no Orçamento de Estado. Há tempos, a sra. ministra explicou: cada aluno custa ao erário público 3 mil euros por ano, logo um aluno reprovado fica por 6 mil. Em 2007, os "chumbos" no ensino básico e secundário pesaram 600 milhões na despesa, uma enormidade que poderá perfeitamente ser aplicada no aprimoramento tecnológico da rede escolar, de modo a que os alunos que "transitam" na maior ignorância o façam nas melhores condições. Um ponto a favor do avanço em geral".
Alberto Gonçalves, Diário de Notícias, de 28 de Julho de 2009

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