Santana Castilho - Curto e Claro
Um banco é um banco e uma escola é uma escola
Mal se tornou conhecida a intenção de integrar nos quadros os precários de toda a vida, e logo começaram a aparecer os bichos da opinião pública (analogia com o bicho da madeira) a iniciarem, pacientemente, o seu trabalho.
Dois conceituados jornalistas, Miguel Sousa Tavares, na SIC, ao que me lembro no habitual comentário no Jornal da Noite das segundas, e David Dinis, no Público de ontem, sob a epígrafe “Moscovici, Costa e Sampaio. Foi quase um mar de rosas”, criticaram a medida com um raciocínio que assim se pode sintetizar:
Então passam os contratados para o quadro, quando a média do número de alunos por turma é inferior à da Europa e nos próximos 5 anos o número de alunos vai descer drasticamente?
Longe de mim atribuir má-fé às considerações tecidas por estes carpinteiros da opinião pública. Tão-só porque escrevem tanto e opinam tanto sobre tantas coisas, não podem, humanamente, conhecer algumas delas. Deixem-me pegar no pincel e na lata de Xilofene (produto com que se pincelam as superfícies para as proteger do bicho da madeira) e prevenir a praga que já começou:
1. Os que vierem a entrar, se a medida se concretizar, já estão no sistema com contratos sucessivos, precários, há 5, 10, 15, alguns 20 anos. Não se trata de admitir mais gente. Trata-se de dar um estatuto de estabilidade mínima à gente que já lá está e tem sido tratada como coisas, escravos da era moderna, ao longo dos tempos, longos tempos. Não há correlação séria entre o que sugerem os senhores jornalistas e a medida. A questioná-la, os argumentos teriam que ser, no mínimo, outros.
2. A questão da média é a velhíssima questão da interpretação dos dados estatísticos. O problema é bem mais complexo que o simples tratamento com recurso ao indicador “média”. Tornava longa e complexa esta nota, que se quer curta e clara, se dissertasse sobre todas as variáveis possíveis e relevantes. Invoco apenas dois exemplos, sob a forma de duas perguntas:
2.1. Há muitas escolas neste país que têm, na mesma sala, no ensino básico, crianças de vários anos desse ensino. Há casos que têm os 4 anos do primeiro ciclo na mesma sala. Terão pensado, os senhores jornalistas, o que resulta para a “média” se se fizer o que tem que ser feito, isto é, pôr um professor por cada ano de escolaridade? Aceitariam, os senhores jornalistas, como muitos pais são obrigados a aceitar, que o mesmo professor ensine, ao mesmo tempo, na mesma sala, crianças do 1º ao 4º ano, se lá tivessem os filhos?
Como fazer quando, por razões demográficas e de desastrosa gestão do território, temos o país deslocado para o litoral e grandes cidades? Se um professor em Mourão tem 12 alunos na sala, porque não há mais crianças lá, e em Lisboa outro tem 32, é justo invocar a “média”, sem considerar este (e outros) factores de ponderação? Para continuar na alegoria da madeira, admitiriam, os senhores jornalistas, carpinteiros da opinião pública, serrar ao meio o professor de Mourão, por causa da “média”? Quem ficaria com o tronco e a cabeça e para onde enviariam, os senhores jornalistas, carpinteiros da opinião pública, as partes baixas?
2.2. Tomemos por exemplo o caso da celebrada Finlândia, com uma “média” superior à nossa. Saberão, os senhores jornalistas, que 25% dos alunos da Finlândia têm um segundo professor a assisti-los? Que aconteceria à “média” se as contas fossem feitas de outro modo?
3. Disseram, os senhores jornalistas, que nos próximos cinco anos o número de alunos vai descer (110.000). Referem-se a uma previsão agora tornada pública. Lá vai Xilofene:
Não se deram conta, os senhores jornalistas, carpinteiros da opinião pública, que a previsão respeita só ao ensino básico? E que acontece ao número de alunos, de todo o sistema, se atingirmos o objectivo Europa 2020?
Que acontece ao número de alunos se cumprirmos, efectivamente, a escolaridade obrigatória de 12 anos?
Que acontece ao número de alunos se anularmos o abandono escolar?
Que acontece ao número de alunos se se efectivar a política anunciada de ensino de adultos (900 milhões de euros previstos nas Grandes Opções do Plano para 2017)?
Que acontece ao número de alunos se recebermos os 900 mil imigrantes que Correia de Campos (presidente do Conselho Económico e Social) acaba de considerar vitais para que a economia cresça?
E não dizem as mesmas previsões que a inversão dos dados demográficos se começará a registar a partir de 2021?
Por fim, terão, os senhores jornalistas, considerado a previsão do número de professores que se aposentarão nos próximos anos? Terão, ainda, os senhores jornalistas, pensado que, se se concretizar o descongelamento da progressão na carreira, isso significa milhares de horas de novas necessidades?
Pode o país pagar tudo isto? Essa é outra questão. Porque um banco é um banco e uma escola é uma escola.
Dois conceituados jornalistas, Miguel Sousa Tavares, na SIC, ao que me lembro no habitual comentário no Jornal da Noite das segundas, e David Dinis, no Público de ontem, sob a epígrafe “Moscovici, Costa e Sampaio. Foi quase um mar de rosas”, criticaram a medida com um raciocínio que assim se pode sintetizar:
Então passam os contratados para o quadro, quando a média do número de alunos por turma é inferior à da Europa e nos próximos 5 anos o número de alunos vai descer drasticamente?
Longe de mim atribuir má-fé às considerações tecidas por estes carpinteiros da opinião pública. Tão-só porque escrevem tanto e opinam tanto sobre tantas coisas, não podem, humanamente, conhecer algumas delas. Deixem-me pegar no pincel e na lata de Xilofene (produto com que se pincelam as superfícies para as proteger do bicho da madeira) e prevenir a praga que já começou:
1. Os que vierem a entrar, se a medida se concretizar, já estão no sistema com contratos sucessivos, precários, há 5, 10, 15, alguns 20 anos. Não se trata de admitir mais gente. Trata-se de dar um estatuto de estabilidade mínima à gente que já lá está e tem sido tratada como coisas, escravos da era moderna, ao longo dos tempos, longos tempos. Não há correlação séria entre o que sugerem os senhores jornalistas e a medida. A questioná-la, os argumentos teriam que ser, no mínimo, outros.
2. A questão da média é a velhíssima questão da interpretação dos dados estatísticos. O problema é bem mais complexo que o simples tratamento com recurso ao indicador “média”. Tornava longa e complexa esta nota, que se quer curta e clara, se dissertasse sobre todas as variáveis possíveis e relevantes. Invoco apenas dois exemplos, sob a forma de duas perguntas:
2.1. Há muitas escolas neste país que têm, na mesma sala, no ensino básico, crianças de vários anos desse ensino. Há casos que têm os 4 anos do primeiro ciclo na mesma sala. Terão pensado, os senhores jornalistas, o que resulta para a “média” se se fizer o que tem que ser feito, isto é, pôr um professor por cada ano de escolaridade? Aceitariam, os senhores jornalistas, como muitos pais são obrigados a aceitar, que o mesmo professor ensine, ao mesmo tempo, na mesma sala, crianças do 1º ao 4º ano, se lá tivessem os filhos?
Como fazer quando, por razões demográficas e de desastrosa gestão do território, temos o país deslocado para o litoral e grandes cidades? Se um professor em Mourão tem 12 alunos na sala, porque não há mais crianças lá, e em Lisboa outro tem 32, é justo invocar a “média”, sem considerar este (e outros) factores de ponderação? Para continuar na alegoria da madeira, admitiriam, os senhores jornalistas, carpinteiros da opinião pública, serrar ao meio o professor de Mourão, por causa da “média”? Quem ficaria com o tronco e a cabeça e para onde enviariam, os senhores jornalistas, carpinteiros da opinião pública, as partes baixas?
2.2. Tomemos por exemplo o caso da celebrada Finlândia, com uma “média” superior à nossa. Saberão, os senhores jornalistas, que 25% dos alunos da Finlândia têm um segundo professor a assisti-los? Que aconteceria à “média” se as contas fossem feitas de outro modo?
3. Disseram, os senhores jornalistas, que nos próximos cinco anos o número de alunos vai descer (110.000). Referem-se a uma previsão agora tornada pública. Lá vai Xilofene:
Não se deram conta, os senhores jornalistas, carpinteiros da opinião pública, que a previsão respeita só ao ensino básico? E que acontece ao número de alunos, de todo o sistema, se atingirmos o objectivo Europa 2020?
Que acontece ao número de alunos se cumprirmos, efectivamente, a escolaridade obrigatória de 12 anos?
Que acontece ao número de alunos se anularmos o abandono escolar?
Que acontece ao número de alunos se se efectivar a política anunciada de ensino de adultos (900 milhões de euros previstos nas Grandes Opções do Plano para 2017)?
Que acontece ao número de alunos se recebermos os 900 mil imigrantes que Correia de Campos (presidente do Conselho Económico e Social) acaba de considerar vitais para que a economia cresça?
E não dizem as mesmas previsões que a inversão dos dados demográficos se começará a registar a partir de 2021?
Por fim, terão, os senhores jornalistas, considerado a previsão do número de professores que se aposentarão nos próximos anos? Terão, ainda, os senhores jornalistas, pensado que, se se concretizar o descongelamento da progressão na carreira, isso significa milhares de horas de novas necessidades?
Pode o país pagar tudo isto? Essa é outra questão. Porque um banco é um banco e uma escola é uma escola.