Paulo Guinote - ComRegras
Aquilo que actualmente é designado como “gestão de conflitos”, nomeadamente na sala de aula, é algo que talvez faça agora parte de alguma disciplina na formação inicial de futuros professores mas que, durante os anos de formação ou profissionalização da generalidade dos professores dos actuais quadros, praticamente ninguém ouviu falar, nem mesmo sob a cobertura mais directa da questão da indisciplina na sala de aula. É verdade que eu só fiz uma daquelas profissionalizações marteladas para malta que já andava a dar aulas há bastante tempo, em que a Psicologia e Sociologia da Educação eram dadas por atacado, mas não me parece que tenha sido muito diferente ao longo dos anos 80 e 90 do século passado, atendendo ao que sei de muitos outros colegas e modelos de formação inicial ou profissionalização, o que os dados da primeira sondagem comprovam.
Quer-me igualmente parecer, mesmo desconhecendo eu o plano de estudos de muitos dos cursos actuais de formação de professores e como eles se desenrolam no concreto, que a abordagem actual deste tipo de questões se faz muito pela análise teórica, pelas teorias sobre as razões dos comportamentos de indisciplina e técnicas de gestão de conflitos, mas muito pouco pelo contacto directo com situações do quotidiano real, em carne e osso, quando é necessário aliar ao saber teórico um controle das emoções e reacções no tempo curto de segundos e não no tempo da reflexão escrita.
Esta falha tem sido colmatada de modo muito deficiente por acções de formação contínua, mesmo se o tema se tornou um pouco “moda” na última década. Se há formações nesta área que se revelam inovadoras e dinâmicas, com a simulação de situações reais e a apresentação de cenários de resolução para debate entre os participantes em modelo de workshop ou círculo de estudos e não de palestras, é difícil negar que a aprendizagem da maior parte dos professores em exercício se fez ao longo da sua prática docente, com tentativas e erros, com experiências mais ou menos conseguidas, conforme os contextos e culturas de escolas, assim como as características dos diferentes grupos-turma ou alunos individuais.
Como poderia ser isto de outra forma? Ao nível da formação inicial com uma interacção muito maior entre as abordagens teóricas e o quotidiano escolar, com os futuros professores a assistirem na 1ª pessoa a aulas com grupos problemáticos, sem receios por parte dos docentes envolvidos em partilhar as suas experiências e vivências, sem pretensões de magistério ou apresentação de fórmulas únicas numa matéria tão complicada. Do mesmo modo, as acções de formação contínua devem ser repensadas para não se limitarem a repetir o que já é sabido, replicando-se ano após ano, de acordo com sebentas cristalizadas há mais ou menos tempo. Devem ser organizadas numa perspectiva multidisciplinar e não fugindo ao conflito entre formas diferentes, antagónicas ou complementares, de encarar a origem, prevenção ou resolução dos fenómenos de indisciplina ou “conflito” na sala de aula ou no espaço escolar. Porque o assunto não é apenas do interesse de professores deve mobilizar outro tipo de profissionais da Educação e, muito importante, chamar ao diálogo os alunos e as suas famílias. Sem este leque amplo de olhares sobre estes fenómenos, quase tudo permanecerá sem grandes alterações, com queixas sobre falta de formação ou com insatisfações diversas acerca daquela que existe. E esse será um péssimo serviço prestado a todos aqueles que vivem o seu quotidiano nas escolas e nas salas de aula.
Paulo Guinote