O
Relatório do Tribunal de Contas sobre o processo de transferência de competências para os Municípios, hoje
divulgado, e que abrangeu o período de 01.01.2019 a 30.09.2022, evidencia a relevância deste processo de reforma
estrutural da organização do Estado.
Face aos desenvolvimentos verificados nos últimos anos, e tendo-se iniciado um novo ciclo com a publicação da Lei-Quadro de 2018, o Tribunal sublinha ser essencial avaliar a sua implementação e a prossecução dos propósitos
enunciados, o que implica somar à ótica financeira, a avaliação da qualidade da despesa e da eficácia das políticas
públicas, uma vez que a sua dimensão e complexidade comportam riscos, exigências e necessidades de adaptação a
uma realidade em evolução.
O Tribunal observou insuficiências de planeamento, a ausência de estudos atualizados que identificassem os
domínios a descentralizar, a estimativa dos ganhos de eficiência ou os critérios de apuramento do respetivo
financiamento. A complexidade e sensibilidade social das áreas envolvidas exige rigor técnico no apuramento das
necessidades de financiamento e a conciliação de interesses que permitam gerar as soluções que melhor beneficiem
os cidadãos.
A implementação do processo de descentralização afastou-se dos prazos e pressupostos estabelecidos na Lei-quadro,
para além do que possa ser imputável à pandemia do COVID-19, traduzindo-se, nomeadamente, no diferimento da
publicação dos diplomas setoriais, no prolongamento do período de aceitação de competências, na dificuldade em
obter o acordo ou promover a iniciativa dos municípios e na não implementação atempada do Fundo de
Financiamento para a Descentralização.
O Tribunal concluiu que a informação relativa à evolução da implementação do processo de descentralização era
insuficiente e inconsistente e que tal teve impacto na qualidade do acompanhamento e monitorização, que revelou
muitas fragilidades. A Comissão de Acompanhamento da Descentralização não procedeu à avaliação da
adequabilidade dos recursos financeiros de cada área de competências e constata-se a ausência de uma visão
estruturada e a nível nacional da evolução do processo.
O Tribunal constatou que os ajustamentos introduzidos no processo, com base em acordos com a ANMP, visaram
satisfazer alegadas insuficiências no financiamento e na operacionalização das transferências ou na partilha de
responsabilidades, não se encontrando consolidados mecanismos estáveis e transparentes de financiamento das
competências a descentralizar.
O Tribunal considera ser desejável que o financiamento do processo de descentralização se consolide num formato
que contribua para a convergência dos territórios e potencie a existência de finanças municipais saudáveis, atentos
os princípios da estabilidade de financiamento, da coesão territorial e da garantia da universalidade e da igualdade
de oportunidades no acesso ao serviço público.