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segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Bullying psicológico sobre professores e as escolas para acabar com os chumbos

A propósito da publicação da DGEEC, Resultados escolares por disciplina – 2.º e 3.º ciclos do ensino público geral - Portugal Continental - 2011/12 - 2019/20, da nota à comunicação social do próprio governo e reagindo à notícia publicada no JNJosé Eduardo Lemos, Presidente do Conselho das Escolas,  escreveu o seguinte comentário na sua página pessoal no Facebook

«« Novidade - um estudo feito pelo Ministério da Educação com conclusões alinhadas com a política do Ministério da Educação.
Conclusão do estudo - a retenção (chumbo) dos alunos tem baixa eficácia como medida para a melhoria dos resultados.
Falsidade da premissa – a retenção nunca foi uma medida pedagógica para se melhorarem os resultados, mas sim consequência de conhecimento/aprendizagem considerado insuficiente pelos professores ou de excesso de faltas injustificadas. O chumbo não é uma "medida para" é uma "consequência de".
Objetivos do “estudo” - transformar a retenção numa medida pedagógica (falso), transmitindo aos professores e às escolas a mensagem de que não se deve chumbar nenhum aluno porque tal não contribui para o sucesso.
Objetivo do Ministério – acabar com os chumbos.
Estratégia seguida – Bullying psicológico sobre professores e escolas.
Cidadania - Do ponto de vista ético e no quadro de um relacionamento transparente e responsável com cidadãos, ficava muito melhor melhor ao Governo criar uma alínea na lei que impedisse o chumbo. »»

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Audição do Ministro na Comissão de Educação

Amanhã, 17 de dezembro, às 15 horas e 30 minutos o desaparecido Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, estará no Parlamento para uma audição perante a Comissão de Educação Ciência, Juventude e Desporto  para prestar esclarecimentos sobre:

. a falta de trabalhadores na escola pública [requerimento do PCP]

. a falta de funcionários não docentes nos estabelecimentos de ensino [requerimento do BE];

. o plano de não retenção de alunos no ensino básico [requerimento do CDS-PP].

sábado, 30 de novembro de 2019

"os chumbos são proibidos, mas podem acontecer, só que são proibidos"

Luís Filipe Torgal

A atual autonomia escolar impôs às escolas menos liberdade e mais dependência dos intricados decretos e portarias ordenados por este ME e a flexibilidade educativa pouco acrescentou ao que já se fazia

Ricardo Araújo Pereira criou uma rábula hilariante a propósito da opinião do então jurista e comentador, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre a lei do aborto votada em referendo. Podemos transpor o espírito dessa rábula para a decisão tomada pelo atual governo sobre os chumbos no ensino básico (e, diria, também no ensino secundário): os chumbos são proibidos, mas podem acontecer, só que são proibidos.

De facto, o governo decidiu suprimir as reprovações através de um processo administrativo não assumido. Para justificar a sua posição atafulhou os agentes da educação e a opinião pública com vários argumentos, uns falaciosos, outros mal esclarecidos. Por exemplo, o Ministério da Educação (ME) é pródigo a reproduzir a tese de que chumbar é ineficaz e a sustentar o argumento de que custa muito dinheiro ao Estado. Mas não explica que um chumbo pode ser proveitoso, desde que seja acompanhado por um apoio verdadeiramente individualizado concedido ao aluno retido. Não publicita que, na última década, a escola pública portuguesa tem vindo a baixar significativamente as taxas de insucesso escolar. Quando invoca as estatísticas das reprovações inscritas na OCDE, esconde que os países que apresentam números mais reduzidos de insucesso escolar investiram, muito antes de Portugal, num sistema educativo inclusivo, dispõem de escolas bem mais modernas e apetrechadas, valorizam o papel dos professores, têm níveis de alfabetização e literacia consolidados, em muitos casos desde o início do século XX, e sociedades menos desiguais e, por conseguinte, mais equilibradas nos domínios económico, académico e cultural. O ME também não consegue demonstrar que as escolas que iniciaram esta última reforma mais cedo e que reproduzem dogmaticamente a retórica deste ME e as tendências da chamada «Escola Moderna» estão a obter melhores resultados nos exames nacionais dos ensinos básico e secundário.

Decerto que todos os agentes da educação desejam combater o insucesso escolar nacional. Mas sem ultrarromantismos, folclorismos, demagogismos e processos maquiavélicos. Afinal, a atual autonomia escolar impôs às escolas e às suas direções menos liberdade e mais dependência dos intricados decretos e portarias ordenados por este ME. A flexibilidade educativa pouco acrescentou às práticas pedagógicas usadas por muitos professores e escolas; pelo contrário serviu sobretudo para legitimar teorias e experiências pedagógicas esdrúxulas que são hoje contraditadas, inclusive nos países nórdicos, por diversos pedagogos contemporâneos, porquanto, em muitos casos, estão a obstruir o acesso ao conhecimento.

Os inextricáveis critérios de avaliação definidos por domínios afundaram os professores numa burocracia ainda mais esquizofrénica, impraticável e inaceitável, estão também a prejudicar as aprendizagens efetivas dos alunos, a desconcertar direções de agrupamentos, professores, alunos e encarregados de educação, a tolher a aferição dos comportamentos cívicos dos alunos e a disseminar ainda mais a indisciplina na escola. A atual avaliação de professores é um embuste que favorece sobretudo os mais oportunistas.

Se o Ministério da Educação pretende, de facto, modernizar o ensino e eliminar os chumbos terá que reformular currículos e reduzir programas de muitas disciplinas. Terá que investir mais nas escolas, sobretudo do interior do país ou das áreas urbanas mais problemáticas: requalificar os edifícios deploráveis dessas escolas, bem como investir em tecnologia e modernos recursos pedagógicos. Terá que contratar mais professores para rejuvenescer o corpo docente (um estudo recente da CNE diz-nos que 52,9% dos docentes têm mais de 50 anos), reduzir o número de alunos por turma, multiplicar tutorias e apoios pedagógicos. Terá que contratar mais psicólogos e assistentes sociais. Terá que repensar os cursos de formação e atualização científica e pedagógica dos seus professores. Terá que encontrar uma fórmula bem mais rigorosa e justa de avaliar os seus docentes.

Tudo isto custa ao Ministério tempo e dinheiro – duas exigências que o ME não está disposto a cumprir. Por isso, será sempre mais fácil «proibir» os chumbos, urdir passagens administrativas, ludibriar alunos, professores e pais, e arrastar as escolas para um ambiente de paz podre. Como escreveu Maquiavel no Príncipe: «Os homens são tão simples e tão obedientes às necessidades do momento, que quem engana encontra sempre quem se deixe enganar».

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

A opinião de Santana Castilho

Os espanadores e o senso comum

Santana Castilho 


1. Interpelado por Rui Rio no último debate quinzenal, António Costa meteu os pés pelas mãos no discurso, mas esclareceu as intenções: invocando argumentos não demonstrados, travestiu de progresso mais um retrocesso, qual seja o de acabar com as reprovações no ensino básico. Petulante, acusou Rui Rio de se guiar pelo “senso comum”, em lugar de seguir “decisões informadas”. O problema é que qualquer pavão que use as decisões do PS em matéria de Educação, “assentes nos estudos pedagógicos mais informados”, ficará reduzido a espanador pelo simples “senso comum”.

Na altura, António Costa exibiu a primeira página de um estudo que não leu, sobre uma matéria que nunca lhe importou. O estudo, que não diz o que ele disse que diz, é teoricamente bem construído, mas deve ser confrontado com a realidade. E a realidade mostra que as reprovações estão associadas a alunos carenciados e à falta de recursos das famílias e das escolas. Eliminá-las passa por políticas sociais que combatam as desigualdades, que não por colocar ainda mais pressão sobre professores desmotivados, mal pagos, expostos à indisciplina e à violência que grassam nas escolas e escravizados por trabalho sem sentido e normativos manicomiais.

2. É enviesado o raciocínio de quantos afirmam que o “chumbo” não serve para nada. Como se o “chumbo” fosse um instrumento de ensino. O “chumbo” é apenas uma expressão classificativa, de último recurso, que introduz um limiar de exigência mínima numa escala classificativa (classificar é seriar). A taxa de reprovações em Portugal (13,6% no secundário e 5% no básico, dados de 2017/2018) tem vindo a diminuir ao longo dos anos e os resultados do nosso sistema de ensino têm vindo a melhorar nas avaliações internacionais, não sendo possível, contrariamente ao que afirmam os porta-vozes do regime, falar de consenso na produção científica sobre os malefícios das reprovações. Há matérias que requerem aprendizagens incrementais e acumulativas, sendo garantido o desastre quando se pula para um nível superior sem domínio do anterior.

3. Quando se retomou a actual polémica sobre a validade das reprovações, li e reli que a sua abolição significaria uma poupança de 250 milhões de euros por ano. É fácil perceber como os criadores da cifra a calcularam: multiplicaram o número de reprovados pelo custo médio anual por aluno. Só que as coisas não se passam assim, já que uma eventual passagem automática de todos não iria originar a redução de professores, de assistentes operacionais e técnicos e o encerramento de escolas, variáveis que determinam os custos.

4. Melhor seria que, logo no primeiro ciclo, detectássemos com rigor as dificuldades de acompanhamento do currículo (fragilidades familiares, cognitivas ou de outra natureza), caracterizando o potencial de desenvolvimento de cada aluno. Isto a partir da ideia de que não deve ser o currículo que se flexibiliza, mas os apoios que se reforçam. Isto que suporia, naturalmente, a existência nas escolas de equipas multidisciplinares estáveis. Do mesmo passo, parece-me importante um debate sério e profundo sobre a eventual alteração para os sete anos da idade de entrada no ensino básico e a eventual junção dos segundo e terceiro ciclos num só.

No que toca ao secundário, com o tempo decorrido sobre o prolongamento da escolaridade obrigatória de nove para 12 anos, o país ganharia em discutir, sem preconceitos, a continuidade ou a reversão da medida (na UE só seis países têm 12 anos obrigatórios), bem assim como repensar toda a lógica organizativa e curricular da via profissionalizante.

Ao anterior acresce que as “aprendizagens essenciais” assentam na ideia equívoca de que o aluno é capaz de construir autonomamente o seu próprio conhecimento, através de “projectos” funcionais e imediatamente utilitários, desenvolvidos preferencialmente com metodologias lúdicas. Este conceito, que se foi impondo insidiosamente, vem originando uma organização avulsa e destruturada do currículo nacional. A ênfase dada às competências vem negligenciando o conhecimento, quando o conhecimento é nuclear para qualquer tipo de desempenho. Por outro lado, a interpretação que alguns fazem da autonomia curricular põe em perigo a garantia de que um conhecimento principal e nacional seja proporcionado a todos os estudantes, de modo equitativo e universal.
(Negrito nosso)

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

"A educação não precisa de ideais, mas de soluções concretas com os recursos materiais e humanos existentes"

Rumo à retenção zero
Teresa Cunha Pinto

Portugal não precisa de alterações estatísticas, mas de melhores resultados. Não precisa de caminhos fáceis, mas de caminhos que exijam e que sejam capazes de formar cidadãos do futuro.

Mais uma vez diante de nós está um Governo sedento de grandes e gloriosos resultados estatísticos e tão pouco interessado naquilo que constitui a centralidade dos problemas do país. Falo da Educação. Vemos um Governo, com as suas já tão conhecidas habilidades, a tentar mascarar um problema. Mais um. Há mais de quatro anos que vemos um Governo a tentar passar pelos pingos da chuva, em manobras de malabarismo e de ilusionismo, fingindo que tudo está bem e sorrindo sempre para a fotografia.

Tenho, a par de tantas outras pessoas, grandes reticências sobre o ponto do programa do Governo que diz “Criar um plano de não retenção no Ensino Básico, trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos que revelam mais dificuldades”. Não é, afinal, isto aquilo que andamos todos a querer e a desejar para a educação em Portugal? Que a qualidade do Ensino se traduza numa progressiva redução dos chumbos e no aumento do aproveitamente escolar? De facto, devemos combater a retenção, mas não com medidas desenquadradas da realidade portuguesa nem com medidas que promovam o facilitismo e a desresponsabilização dos alunos.

Estou certa de que o Governo pouco ou nada conhece da realidade das escolas em Portugal. Diria que saberá tanto quanto um estrangeiro acabado de chegar ao país. A minha mãe é professora, frequentei o ensino público durante muitos anos e sempre tive contacto de perto com a realidade, mas a verdade é que bastam uns olhos minimamente atentos para se perceber o contexto actual e os desafios que o ensino público em Portugal enfrenta.

A educação não precisa de ideais, mas de soluções concretas com os recursos materiais e humanos existentes. Não adianta propor-se um trabalho individualizado com cada aluno e um maior acompanhamento quando não há meios que o consigam garantir, nem quando estes não são valorizados. A criação do dito plano implicaria a supressão dos níveis escolares passando, desta forma, a haver níveis para cada área de conhecimento. Um plano muito pouco exequível e profundamente desconhecedor da realidade que vivemos.

Será que este plano pretende contribuir de verdade para o aumento do sucesso escolar ou será apenas uma forma do Governo encobrir mais uma vez os seus fracassos?

É importante, também, referir que o sucesso escolar não depende, unicamente, dos professores e das suas práticas, o sucesso escolar não depende, exclusivamente, dos factores externos ao aluno. O sucesso escolar depende, também, do próprio aluno, da sua consciência cívica e moral, dos tão importantes sentidos de responsabilidade, de compromisso e de interesse. O aluno não pode ser a vítima constante e o eterno incompreendido. O aluno deverá ser responsabilizado pelo seu sucesso e pelo seu insucesso escolar. Quem é o maior interessado pelo sucesso escolar que não o próprio? É, pois, fundamental e urgente promover a responsabilização pessoal de cada aluno para que haja espaço para uma justa e tão essencial valorização do ensino.

Medidas como esta, tão pouco concretas e tão desenquadradas da nossa realidade facilmente caem no facilitismo e no favorecimento, um caminho fácil que em nada contribuirá para o verdadeiro sucesso e interesse escolar do aluno, que em nada contribuirá para a sua formação.

Pergunto-me, até, se as menos 30 mil retenções nos últimos dois anos foram fruto de um real empenho ou se foram apenas o reflexo de um facilitismo que nos trará a todos enormes problemas para o futuro.

Portugal não precisa de alterações estatísticas, mas de melhores resultados. Não precisa de caminhos fáceis, mas de caminhos que exijam e que sejam capazes de formar cidadãos do futuro. O país não precisa de alunos descansados, precisa de alunos responsabilizados e comprometidos.

Chegar à retenção zero seria uma vitória! Mas apenas seria uma verdadeira vitória se lá chegássemos de forma justa, igual e merecedora, com soluções reais, conhecedoras e conscientes dos problemas e dos desafios que imperam nas escolas portuguesas.

terça-feira, 19 de novembro de 2019

A promessa demagógica de um plano de não-retenções na opinião de Paulo Guinote

Paulo Guinote 

Tal como o mandato de 2015 começou com a eliminação demagógica das provas finais de 4.º e 6.º ano, o mandato de 2019 começa com a promessa demagógica de um plano de não-retenções que só fará sentido se, como culminar do processo, forem eliminadas as provas finais do 9.º ano.

As últimas semanas foram em grande parte ocupadas com preocupações quanto à eventual expansão em Portugal de forças políticas “radicais” com uma matriz “populista” e um discurso ”demagógico”, como se isso fosse uma enorme novidade entre nós. Li e ouvi muitas análises, de gente com belos pergaminhos na matéria, a definirem “demagogia” de um modo bastante simples, como uma forma de actuação política em que se fazem promessas que procuram agradar às massas populares, apelando à emoção e a uma adesão afectiva imediata. Em alguns casos, perante a evidência de tal “perigo” não ter conseguido atrair mais de 1-2% dos votos, adapta-se a definição a promessas destinadas a nichos específicos do eleitorado. O que não deixa de ser contraditório. Assim como se afasta da etimologia do termo que corresponde a algo como a arte ou técnica de conduzir o povo, sendo “demagogo” aquele que lidera as massas populares com a promessa de medidas que satisfarão as suas necessidades e aspirações.

Seja em que acepção for, nada é mais “demagógico” do que o manifesto eleitoral de qualquer partido dominante num sistema político, comprovando-se isso nas urnas, pois terá mais votos aquele que prometa mais e melhor. Aquele que apelar ao maior número, em especial se as promessas resultarem da identificação de “problemas” e, ainda melhor, se apontarem “culpados” e apresentarem “soluções” quase miraculosas na sua simplicidade.

A Educação é uma área onde esta luta política se instalou de modo insistente nas últimas décadas, a partir da identificação de “problemas” que urge combater, mesmo aqueles que parecem transitar de mandato em mandato sem solução satisfatória, quando os governantes de ontem são os mesmo de hoje.

As últimas semanas foram ricas numa investida demagógica mal disfarçada do actual governo em relação à questão das “retenções” (os conhecidos “chumbos”) no Ensino Básico. Aproveitando-se de recomendações do Conselho Nacional da Educação (que motivam entusiasmos ocasionais de forma selectiva) e usando a sua presidente como testa de ferro útil para defender a medida, enquanto se lançam números para a comunicação social sem fonte claramente identificável para depois ser possível negar qualquer responsabilidade, fez-se saber que há/haverá um “plano” para eliminar as retenções no Ensino Básico e que isso gerará muitos milhões de euros de poupanças para as Finanças Públicas.

Perante a reacção dos que temem uma Escola Pública de segunda linha, onde todos passariam de ano sem critério, o ministro surgiu a dizer que, afinal, o que se passa é que professores e escolas irão passar a “trabalhar mais com os alunos” no sentido de superar as suas dificuldades de aprendizagem. Isto dias depois de o secretário de Estado Costa ter afirmado que não existia ainda plano nenhum, anos depois de estar em implementação o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, assim como os Projectos-Piloto de Inovação Pedagógica e um dia depois de o próprio ministro ter apresentado o Includ-Ed, “projecto” que abrange 50 escolas.

Haverá algo mais demagógico do que fazer este tipo de promessa de “não-retenção”, falseando-se os números das poupanças (os alunos que não transitam são redistribuídos pelas turmas, não implicando necessariamente a formação de novas turmas e a contratação de mais professores), usando-se valores inflacionados e, o que acho mais grave, dando a entender que a responsabilidade das retenções existentes resulta do “menor” ou “pior” trabalho de escolas e professores? Porque é isto que resulta das afirmações do ministro, por muito que se negue o que é evidente.

Significa que as retenções são algo que não deve ser eliminado? Claro que não, pois elas têm vindo a diminuir de forma significativa, existindo há anos legislação nesse sentido e imensos “planos/projectos” ao longo dos anos para essa finalidade. Mas, tal como o mandato de 2015 começou com a eliminação demagógica das provas finais de 4.º e 6.º ano (substituindo-as por umas impensáveis provas de aferição a começarem logo no 2.º ano...), o mandato de 2019 começa com a promessa demagógica de um plano de não-retenções que só fará sentido se, como culminar do processo, forem eliminadas as provas finais do 9.º ano.

Há quem considere que estas são medidas maravilhosas, promotoras do “sucesso” e da “igualdade de oportunidades”. Mas é difícil não ver em todo este processo uma nova fase na erosão da Escola Pública como garantia de um serviço público de primeira qualidade com base na mais básica demagogia.

sábado, 16 de novembro de 2019

Em defesa da liberdade dos professores fazerem o seu trabalho

Paulo Guinote, fundamentado em  dois estudos,  afirmou-o ontem em direto no Expresso da Meia-Noite, na SIC Notícias e escreve-o hoje no seu blogue.
"... as retenções podem traduzir-se em melhorias, desde que sejam colocadas em práticas as adequadas medidas compensatórias. Há quem diga que não funcionam, mas se calhar é porque são encaradas como remendos e não são levadas muito a sério, como aquela de 45 minutos de tutoria para meia dúzia de alunos ao molho.
É isto uma defesa pura e dura da prática da retenção? Não, é a defesa pura e dura da liberdade dos professores fazerem o seu trabalho e não serem obrigados por teses pipis a transitar todos os alunos, só porque alguém ainda ficou agarrado às sebentas do “estágio” dos anos 90 do século passado. Seria bom ideia que desencravassem do vosso oásis mental em que aos alunos só se deve dar o que faz falta à sua vida quotidiana. Como respondi a quem isso afirmou, “ainda bem” que aprendemos muita coisa que pode parecer pouco útil a curto prazo. Eu aprendi coisas sobre os planetas e o sistema solar e não fui para astronauta. Gostei muito de saber como funcionam as placas tectónicas ou se desenvolvem as plantas e, num sentido restrito, isso não tem qualquer interesse evidente para a minha vida quotidiana. Como para a maioria das pessoas não terá saber como se desenvolveu o espírito crítico e científico a partir do Renascimento e o que levou a que um homem como Leonardo da Vinci imaginasse, desenhasse e planeasse imensas coisas que não tinha meios para concretizar.
Mas seremos pessoas menos completas se optarmos por um currículo do que apenas “agrada”, do que apenas é “fácil de entender”, do que é “útil”. Se apenas aprendermos o que precisamos para o dia a dia a Humanidade estupidifica e estagna. É esse o grande plano para a Educação do século XXI da nova clique de líderes educacionais? Porque se parece muito com o contrário do que afirmam acerca da criação de cidadãos críticos e interventivos. Pela forma como agem e falam, espírito crítico e informado é do que menos gostam."

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Acabar, administrativamente, com a retenção, é nivelar por baixo, dar um sinal de facilitismo e de desleixo e, sobretudo, prejudicar os alunos.

O SENSO COMUM É POPULISTA?
Filipe Luís - Visão 

O facilitismo do meu 8.º ano e a minha “não retenção” a matemática fez de mim um ignorante. O meu obrigado ao Tiago Brandão Rodrigues daquela escola

Na sua monumental alegoria das “Viagens de Gulliver”, Jonathan Swift não nos apresenta, apenas, a ilha de Liliput e os liliputianos. Na sua viagem ao país governado por cientistas, sábios e filósofos, Balnibarbi, Gulliver demonstra como a teoria pode tornar-se um monte de cacos, quando confrontada com a realidade. As decisões dos dirigentes de Balnibardi, assentes em estudos bem informados, revelam-se um total fiasco, contribuindo para a existência de uma sociedade absurda, de onde o sentido prático – e o senso comum – estão totalmente ausentes. Entre outras atividades, a Grande Academia de Lagado, na Balnibarbi de Jonathan Swift, gasta inúmeros recursos e mão de obra em experiências absurdas, como a de tentar extrair raios de sol a partir de pepinos. O resultado, claro, é o caos administrativo e social.

Esta semana, no debate quinzenal, no Parlamento, o primeiro-ministro, António Costa, foi confrontado com a decisão, “assente nos estudos pedagógicos mais informados”, de acabar com as retenções até ao 3.º ciclo. As retenções, aqui, são um eufemismo – e como o Ministério da Educação gosta de eufemismos, começando por chamar “comunidades educativas” às escolas! - para reprovações, ou, mais em linguagem de “senso comum”, para os “chumbos”. Em resposta a Rui Rio, e depois de muito se enrolar em argumentos não demonstráveis, Costa acabou por tentar fugir, empurrando o tema para um debate específico, a decorrer no futuro. Antes disso, acusou Rui Rio, imagine-se, de se guiar pelo “senso comum”. O elogio, raro entre adversários políticos, foi proferido como se fosse uma crítica , o que, logo na sua premissa, é uma intenção totalmente destituída de “senso comum”... Costa advertiu para os “perigos” de se tomarem decisões políticas baseadas no senso comum, em vez de se tomarem “decisões informadas”. Na verdade, onde o primeiro-ministro queria chegar, é que o senso comum, pelo menos neste caso, tem laivos de populismo.

Ora, é precisamente o divórcio entre o politicamente correto bem informado e o que as pessoas pensam e experimentam na sua realidade quotidiana que abre caminho ao populismo e às forças populistas. É verdade que, na sua perversão, estas forças apelam para instintos básicos e sentimentos negativos: o medo, a intolerância, o egoísmo e a violência. Mas o seu truque fundamental e receita de sucesso está na facilidade que têm em identificar o que se designa por senso comum – distorcendo-o para atingir os seus fins insensatos. Ao afastarem-se desse denominador universal, porque não andam de autocarro nem ouvem o homem da rua, os políticos democráticos perderam terreno e mercado eleitoral para essas forças oportunistas – oportunistas, no sentido em que aproveitam a oportunidade que lhes é deixada.

E quanto à matéria de facto, o fim dos chumbos nas escolas? Rui Rio, como, depois dele, Cecília Meireles, do CDS, apenas quiseram saber o seguinte: Quem não sabe passa ou reprova? É uma pergunta simples que exige uma resposta de sim ou não. Mas o primeiro-ministro, tal como o ministro da Educação, são incapazes de responder. Porque, se calhar, também não sabem bem. Cheira-me, aliás, que esta decisão, tomada em bravata, vai tornar-se uma espécie de “Infarmed no Porto”, take 2…

Numa fuga para a frente, o Governo promete algo com que toda a gente concorda: é preciso apoiar os alunos que têm mais dificuldades, para que “ninguém fique para trás”. Mas este estribilho, que ficaria bem num cartaz de propaganda, tem muito que se lhe diga. As intenções são as melhores: evidentemente que esses alunos devem ser ajudados. A questão está em saber como. O Estado vai contratar uma segunda vaga de docentes, duplicando os já existentes, para providenciar, em todas as matérias curriculares, explicadores para todos, em horário extra? Ou vai exigir a professores já à partida desmotivados – e não apenas pela não reposição integral do rendimento que lhes foi cortado… -, acossados por cenas quotidianas de violência, pressionados pela indisciplina nas aulas e por carregados de educação violentos e impunes, por horários sobrecarregados do trabalho que levam para casa e a braços com os seus próprios problemas familiares (também têm filhos) que deem ainda mais o litro? O Governo propõe-nos um milagre? já agora, em que países ou realidades pedagógicas foram realizados esses estudos? Fizeram-se num quadro igual ao da realidade portuguesa, com professores exaustos e desmotivados, miséria social ao virar da esquina, indisciplina insuportável, escolas com placas de amianto?... Os estudos são transponíveis para Portugal?

E, supondo que a tarefa impossível de ajudar todos os alunos em risco de “retenção” a terem bons resultados era mesmo realizável, o que fazer aos que, mesmo assim, não obtivessem sucesso? Transitavam de ano também? E os que faltarem às aulas? Não chumbam por faltas? António Costa explicou que todos os estudos (voltamos a eles) na área da pedagogia indicam que a retenção provoca mais retenção e que os chumbos são contraproducentes para a melhoria dos resultados curriculares. Ou seja, quer convencer-nos de que quem não sabe e passa, passa a saber. E que quem repete a mesma matéria até a aprender... jamais aprenderá.

É aqui que entra o senso comum. O senso comum não está fechado em gabinetes a analisar estatísticas. O senso comum sabe que alunos de 12 anos, se puderem, preferem não estudar, porque a escola é uma seca. O senso comum intui que os encarregados de educação preocupam-se mais se tiverem medo que os seus filhos falhem. O senso comum pressente que os professores tenderão a relaxar, se tiverem de aprovar toda a gente. O senso comum baseia-se no conhecimento da natureza humana, que só reage a estímulos do tipo prémio versus penalização. É isto mesmo: ao contrário dos teóricos, o senso comum conhece a natureza humana.

Dando de barato que professores motivadíssimos e imbuídos do mesmo espírito missionário do senhor ministro estariam disponíveis para a tarefa. Que teriam tempo, disponibilidade mental, as circunstâncias e os meios para passarem ainda mais horas a ministrar ensino personalizado e a la carte a este e àquele aluno em dificuldades – e o conseguiria fazer sem negligenciar os restantes: pode a aprendizagem em idade escolar ser a única atividade humana que funciona sem o estímulo do chicote e da cenoura? Deve a escola ser um perpétuo recreio ou, pela exigência do esforço e do trabalho, é mesmo suposto que, de quando em vez, seja uma seca? Será que queremos formar cidadãos sem preparação para as muitas secas da vida futura? Aprender a lidar com o stresse (por causa de exames, por exemplo) não deve fazer parte da formação da criança?

Mas isto não é ainda o principal. O principal é saber se, de facto, alunos que não aprenderam o A, conseguem juntar A+B. A experiência pessoal de cada um de nós falará por si. E eu falo da minha. Eu era um excelente aluno de matemática, desde a aritmética da escola primária ao final do primeiro ciclo do meu tempo (5.º e 6.º anos de escolaridade). Mas ali algures entre o 7.º e o 8.º, perdi o fio à meada e não consegui acompanhar a matéria. Ainda assim, sem saber como, apanhei uma professora que passava toda a gente, soubesse ou não soubesse. Cheguei ao 9.º ano, e não só não consegui entrar na matéria – faltavam-me noções básicas -, como tomei a decisão de me livrar o mais rapidamente possível da disciplina, passando “cortado” a matemática e “fugindo” para Humanísticas. Poderia, é certo, como “aluno em dificuldades”, ter tido um “acompanhamento especial”, logo no 8.º ano. Mas, garanto que, aos 14 anos, se me dissessem que iria passar de qualquer modo, jamais me empenharia em aproveitar tal “acompanhamento”… O que devia mesmo era ter repetido a disciplina, no 8.º ano, uma e outra vez, até apreender as competências necessárias para progredir. Estaria, então, em condições de frequentar o 9.º ano, lutar, de novo, por ter aproveitamento e, quem sabe, construir um futuro nas ciências exatas. O facilitismo do 8.º ano, a minha “não retenção”, fez de mim um ignorante. O meu obrigado ao Tiago Brandão Rodrigues daquela escola.

Suponhamos, por um minuto, que um aluno de 14 anos, em dificuldades, tem garantido, por parte do sistema público de ensino, um “acompanhamento especial”. Terá sucesso? Eventualmente. Mas também pode não ter. Quem o garante? O que é mais provável? Cumprir-se a tese do Governo que acha que a igualdade de oportunidades fará de todos os alunos uns génios, ou a dura realidade, que nos diz (deixando, de vez, o politicamente correto) que continua a haver inteligentes e “burros”, ou, pelo menos, alunos que se esforçam, e outros que serão sempre preguiçosos – com motivação ou sem ela? Suponhamos que esta política vale a pena, e tem sucesso. Mais: que, como o Governo promete, todos terão sucesso e “ninguém ficará para trás”. Mas então, se tiverem sucesso, não é necessária uma decisão administrativa a determinar que não haverá retenções! Elas deixarão de existir, naturalmente! Ou seja, se formos suficientemente ingénuos para acreditar na exequibilidade das boas intenções do Governo, o Governo não precisa de decretar a impossibilidade de retenção dos alunos! É a própria evolução deles que fará com que progridam! Ou seja, a medida anunciada, o fim das retenções, é absurda, nos próprios termos das explicações do ministro e do primeiro-ministro.

É do senso comum, e o senso comum deriva da prática, que ninguém consegue adquirir conhecimentos mais avançados antes de adquirir os básicos. Ninguém entende a matemática sem saber aritmética. Ninguém apreende conceitos elaborados sem aprender a ler, escrever e contar. Não se começa pelo telhado. Acabar, administrativamente, com a retenção, é nivelar por baixo, dar um sinal de facilitismo e de desleixo e, sobretudo, prejudicar aqueles que primeiramente deveriam ser beneficiados: os alunos. A mim, prejudicaram-me, no 8.º ano. Não se passa para o nível seguinte sem ter passado pelo anterior. E nisso, os vídeo jogos são uma boa metáfora da vida.

Já que não tem outros argumentos, António Costa despreza o “senso comum”, que considera perigoso, em favor de decisões “bem informadas” que, essas sim, são benignas. Esta argumentação é que é perigosa, por entroncar numa fragilidade que decretou a derrota do socialismo científico: eles é que sabem o que é melhor para o povo. O Ministério da Educação é a vanguarda revolucionária! Se não resultar, siga-se o conselho de Bertolt Brecht: dissolva-se o povo e eleja-se outro.

A propósito de estudos científicos e de “decisões informadas”, o grande economista americano Robert Solow dá um conselho aos seus pares: “Têm de adaptar o vosso modelo ao mundo, não o mundo ao vosso modelo.” A dica bem pode aplicar-se ao nosso Ministério da Educação, que, no seu experimentalismo, por vezes, parece viver na Balnibarbi de Jonathan Swift, ocupado em tentar extrair raios de sol a partir de pepinos.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Os planos do Governo para 2019/2020

Anos divididos em semestres e escolas 100% autónomas. Governo prepara mudanças já para o próximo ano letivo


Planos do Governo para o próximo ano lectivo incluem hipótese de escolas reduzirem o número de alunos por turma, além das aulas por semestre e da autonomia a 100%. Objetivo final é acabar com chumbos.

No próximo ano letivo, o Governo espera que todas as escolas que o queiram fazer possam ter autonomia curricular a 100%. A medida já está inscrita no decreto lei da flexibilidade curricular, mas remete para uma portaria que ainda não foi publicada. Ao Observador, o secretário de Estado da Educação, João Costa, diz ser intenção do Ministério da Educação que esse diploma veja a luz do dia ainda durante este ano letivo, produzindo efeitos só para o próximo (2019/2020).

Para já, e antes de avançar para essa regulamentação, o executivo terá de fazer uma avaliação de fundo ao Projeto Piloto de Inovação Pedagógica, as chamadas escolas PPIP, através do qual sete estabelecimentos de ensino já funcionam com autonomia total. O objetivo principal é perceber se é possível em Portugal haver escolas sem retenção de alunos. Só quando o projeto estiver avaliado e consolidado se generalizará a hipótese de autonomia a 100%.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

A retenção em Portugal e o relatório da OCDE








Jornal Público




O Relatório da OCDE, 'Low-performing Students: Why they Fall Behind and How to Help them Succeed', faz uma análise do insucesso escolar tendo em conta o contexto, o nível de escolaridade e as atitudes face à escola da família dos alunos com fraco desempenho. O relatório também analisa as práticas da escola e as poíticas educacionais que estão mais associadas com o insucesso escolar. Ainda mais importante, os resultados apresentados neste relatório mostram o que os decisores políticos, educadores, pais e os próprios alunos podem fazer para lidar com o insucesso escolar.
CNE

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Evolução dos chumbos

Evolução dos Chumbos

Na Europa há os que chumbam e os que não chumbam. Portugal é dos que mais chumba.

Portugal faz parte dos que chumbam muito e, em 2012, cerca de 35% dos alunos com 15 anos já chumbaram pelo menos uma vez. Portugal e Espanha são os únicos países que viram a sua percentagem aumentar de cerca de 30% em 2003 para perto dos 35% em 2012, tendo-se atingido um pico em 2009. França destaca-se pelo facto de a percentagem de alunos que ficam retidos estar a diminuir, assistindo-se a uma queda acentuada: de 40% em 2003, 37% em 2009 para 28% em 2012.

sábado, 13 de junho de 2015

"o apoio competente e atempado é um fator essencial para a construção de uma escola que é o alicerce de uma sociedade inclusiva"

David Rodrigues - Público


Ninguém ignora as dramáticas consequências da retenção de alunos, isto é, usando uma metáfora da caça, “os chumbos”. Sabemos que na grande maioria dos casos a retenção não é eficaz porque não redireciona o ensino para as áreas em que o aluno apresenta mais dificuldades e, portanto, limita-se a repetir o que já tinha sido dito e como tinha sido dito.

Sabemos até que a retenção, tal como existe atualmente, é uma clara infração às regras que a própria escola criou: se assim não fosse, como é que um aluno seria obrigado a voltar a repetir disciplinas em que foi aprovado? Mais recentemente tomámos conhecimento da dimensão deste fenómeno ao saber que aos 15 anos, 35% dos alunos portugueses já tinham sofrido uma retenção (o que nos coloca entre os países com mais retenção na Europa e na OCDE) e que a retenção tem um custo estimado no nosso país de 600 milhões de euros anuais. Isto já para não falar nas consequências que a retenção tem ao nível individual, na autoestima e no inerente desinvestimento dos alunos.

E levanta-se a magna questão: como se resolve este flagelo, ao mesmo tempo exagerado e injusto? A resposta mais imediata é que este assunto não se resolve de uma vez, com uma medida, mesmo com um único programa. As razões das retenções são muito diferentes e estão fortemente enraizadas na nossa cultura e, portanto, não é previsível que se se resolvam de uma “penada”. Não devemos ceder à tentação de pensar que podemos resolver problemas complexos com medidas pontuais e simples.

Talvez a pergunta pudesse então ser reformulada: “O que seria prioritário para combater a retenção?”. Face a esta pergunta a resposta que parece óbvia é: “Dando mais apoio, dando melhor apoio aos alunos”.

A literatura científica e as posições de organizações internacionais coincidem ao dar como adquirido que o apoio quanto mais cedo for dado, quanto mais precoce, quanto mais preventivo for, melhor. O mesmo tipo de apoio dado numa fase inicial das dificuldades e dado numa fase em que as dificuldades já se encontram instaladas, tem efeitos muito diferentes, isto é, o apoio mais precoce é incomensuravelmente mais proveitoso do que aquele que é dado mais tardiamente. Precisamos pois de um tipo de organização da escola que detete dificuldades, ou mesmo a possibilidade da existência de dificuldades no aluno e comece logo a atuar, de forma preventiva, de forma a que este esboço de dificuldade não se venha a instalar como uma dificuldade estrutural.

Outra característica dos bons apoios aos alunos é que se usem estratégias, tipos de ensino que não sejam uma pura repetição do que já foi dito e ensinado. As crianças e os jovens, não necessitam que ouvir mais uma e outra e outra vez a mesma coisa, necessitam é de olhar a aprendizagem de uma forma diferente, usando vias alternativas, beneficiando de um ensino que identifique com alguma precisão quais são as áreas de dificuldade e quais as melhores estratégias que as permitem ultrapassar. Se o apoio for “mais do mesmo” é muito provável que se esteja a sublinhar e valorizar as áreas de dificuldade em lugar de encorajar as vias de solução, isto é os caminhos alternativos que permitam contornar as dificuldades e facilitar a compreensão e solução do problema.

Por fim, precisamos, para um apoio que seja efetivo, de dispor de profissionais capacitados e com disponibilidade para se debruçar (“inclinar atentamente”) sobre o problema. Os profissionais que estejam muito limitados nos tempos de apoio, que estejam sistematicamente ligados a outras atividades, profissionais que não consigam desligar-se dos seus múltiplos afazeres para se aproximarem do aluno terão muitas dificuldades em ser efetivamente professores de apoio.

Recentemente foi publicado pela Direção Geral de Educação um estudo sobre os Centros de Recursos para a Inclusão. Estes Centros são fundamentalmente centros que proporcionam apoios para os alunos com dificuldades e deficiências que frequentam as escolas regulares. O relatório é muito claro ao apontar deficiências estruturais e conjunturais aos recursos que se colocam nas escolas para apoiar os alunos que mais precisam deles. Os recursos necessários para educar os alunos mais dependentes e que mais precisam deles chegam atrasados, são dados apressadamente e sem que exista uma coordenação entre os professores “regulares” e técnicos de apoio.

Pensar na diminuição ou abolição da retenção significa uma aposta muito clara e financeiramente sustentada num sistema de apoios que não deixe ninguém para trás. Até agora a nossa escola tem estado muito longe deste desiderato: repetimos muito, apoiamos pouco, tarde e mal. Sem dúvida que é urgente inverter este rumo: a escola é a primeira experiência e também a mais decisiva experiência de inclusão. Mas ninguém se inclui se tiver insucesso na escola, se tiver dificuldades que não são respondidas. Assim, o apoio competente e atempado é um fator essencial para a construção de uma escola que é o alicerce de uma sociedade inclusiva.

Há quem diga que este apoio adequado é caro. Mas esta opinião não é muito fundamentada: é dita por pessoas que nunca fizeram contas ao preço da exclusão.
Público, 13/06/2015
(Negrito nosso)

quarta-feira, 25 de março de 2015

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Relatório Técnico sobre a Retenção


O relatório técnico da Recomendação sobre Retenção Escolar no Ensino Básico e Secundário procura sistematizar a evolução do fenómeno da retenção nos diferentes níveis e ciclos de ensino não-superior. 

Para tal, é feito um enquadramento legislativo na área da avaliação, nomeadamente das condições de transição, aplicáveis no sistema de ensino ao longo das últimas duas décadas. O enquadramento recupera o histórico legislativo a partir do Despacho Normativo n.º 98-A/92, de 20 de junho, no caso do Ensino Básico, e do Despacho Normativo, n.º 338/93, de 21 de outubro, no caso do Ensino Secundário."
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segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Recomendação do CNE sobre Retenção no Ensino Básico e Secundário

A Recomendação sobre Retenção Escolar no Ensino Básico e Secundário foi aprovada por unanimidade na 120ª Sessão Plenária do Conselho Nacional de Educação.


"A investigação demonstra que alunos retidos, nomeadamente nos anos iniciais da escolaridade, não melhoram os seus resultados e são mais propensos a uma nova retenção, além da evidente associação entre a retenção e o aumento dos níveis de desmotivação, indisciplina e abandono escolar. Verifica-se igualmente que existe uma maior probabilidade de retenção de alunos com piores condições socioeconómicas, bem como de alunos provenientes de países estrangeiros.

Portugal apresenta um enquadramento legal semelhante aos dos outros países europeus e a retenção é, na legislação em vigor, assumida como uma medida a ser aplicada “a título excecional”. No entanto, na prática, a situação que conduz à decisão de retenção é bastante mais frequente do que um carácter de excecionalidade faria prever."
Público, 23/02/2015