O mestre clérigo e o aprendiz diligente Santana Castilho
Recentemente, o país foi confrontado com o discurso de dois artistas, ambos Costa de sua graça. O primeiro, António, empedernido mestre clérigo na arte de enganar a opinião pública. O segundo, João, diligente aprendiz no ofício de vender aos portugueses gato por lebre e atezaná-los contra os professores.
1. Há uma lei que regula o mecanismo de actualização das pensões de reforma. António Costa, qual senhor feudal, suspendeu-a autocraticamente e ludibriou os súbditos, consciente de que a maioria em que se apoia não lhe porá travão ético. Sim, parte do aumento que a lei garantia aos pensionistas chega-lhes por antecipação em Outubro de 2022. Mas o menor aumento de 2023 repercutir-se-á negativamente e para sempre nos aumentos vindouros. O truque foi baixo, mas teve o alto e instantâneo patrocínio de Marcelo Rebelo de Sousa.
2. Em declarações recentes, o ministro da Educação referiu-se a “padrões de baixas médicas irregulares” por parte dos professores e revelou que está em fase de adjudicação a contratação de juntas médicas para as “vigiar” e “identificar”, eventualmente, como irregulares.
A prática agora anunciada não é nova. Já foi usada pela então Direcção Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo, que contratou uma “clínica médica”, constituída por um médico reformado da PSP e pelo cônjuge, médica reformada da GNR. Pela módica quantia de 54.375,00€, este vasto corpo clínico ficou ao serviço do ministério da Educação por oito meses e 25 dias. Especializou-se em aviar professores à razão de 50 por hora. Pelo menos num caso, em que fui solicitado a intervir, um “criterioso” relatório estava previamente assinado pelo “presidente” da junta, que nem sequer esteve presente na farsa. Quem quiser detalhes, respire um pouco de pó dos arquivos e vá à edição deste jornal, de 13 de Março de 2013.
Porque nestas colunas denunciei macabras decisões de juntas que decretaram o retorno às aulas de professores vítimas de doenças terminais, que morreram dias volvidos, estarei particularmente atento às anunciadas 7.500 juntas do século XXI.
Sete anos em funções governativas não foram suficientes para João Costa perceber que as baixas são um epifenómeno resultante de dois fatores: a classe docente está fortemente envelhecida e temos demasiados professores sem saúde para exercer; as políticas de gestão dos recursos humanos do Ministério da Educação são desumanas e irracionais (a uma semana do início do ano, por altura da primeira reserva de recrutamento, havia 582 docentes dos quadros sem horário letivo numas escolas, enquanto faltavam em abundância noutras), coagindo demasiados professores à precaridade toda a vida e condenando-os a aceitar colocações incompatíveis com a prestação de cuidados de assistência a familiares com doenças terminais ou incapacitantes.
João Costa disseminou o medo no seio dos professores mais fragilizados do sistema. Mentiu e manipulou a opinião pública, provocando-lhe falsas emoções e sentimentos sobre esse grupo de docentes. Com aquele seu jeito sonso, foi aspergindo energia negativa contra e sobre aqueles que devia proteger.
Depois de lançar lama sobre os professores, com maliciosas insinuações de desonestidade, João Costa apressou-se agora a aligeirar culpas próprias referindo que a falta de docentes não é problema exclusivamente português. Como se isso fosse atenuante e não tão-só problema comum a todos os países que incensaram as doutrinas neoliberais de menorização dos servidores públicos.
João Costa nunca entenderá que a Escola, para os professores, não é só o local onde passam a maior parte de todos os seus dias, mas um projeto de vida, ao qual dedicam o melhor de que são capazes.
João Costa tem feito tudo para transformar os professores em operários da sua escola, uma escola sem integridade pedagógica e científica. Misturar a sua cegueira com a busca de uma falsa modernidade vem dando o resultado desastroso de deixar a Educação nas mãos de demagogos, que constroem as diretivas com muita incultura pedagógica e desprezo pelas perspectivas dos outros. Em penúltima instância, a culpa é de quantos percebem o desastre e se resignam, desistindo de lutar. Mas em última, obviamente, a culpa é dele, João Costa