segunda-feira, 10 de setembro de 2018

A Geração Maldita segundo Paulo Guinote

A Geração Maldita?

Paulo Guinote - O Meu Quintal 

É minha convicção, não apenas pelo que leio e ouço, mas mesmo por observação directa, que grande parte da classe política tem um ódio – ou desafeição, para os casos menos graves – particular pela classe docente, mesmo quando saíram dela ou em especial nesses casos. É uma espécie de “luta de classes”, num sentido estranho e algo esquizóide da parte daqueles que parecem querer encapsular-se num mundo muito próprio de “eleitos” (em vários sentidos). Essa desafeição ou ódio é partilhado por um conjunto alargado de gente com posições de relevo na comunicação social. Não vou fazer consultas digitais ao domicílio sobre as causas. Quando falamos directamente com algumas das pessoas percebemos a razão, não sendo raro que depois de despejarem a bílis nos digam que somos, claro, uma excepção à regra.

Isto aplica-se em especial aos que que acham ser professor@s velh@s e inadaptados ao que eles acham as novas tendências, seja da pedagogia “progressista” (caso de académicos, em especial na área das ciências da educação e da formação de professores), seja da “racionalidade financeira” ou da “nova gestão pública” (caso de economistas de 2ª e 2ª linha ou transformados em políticos ocasionais com aspirações a salvar a pátria, desde que paguemos aos bancos os buracos e as rendas às empresas privatizadas ou parcerias público-privadas).

Para essa gente – sim, começo a ceder a uma linguagem mais agressiva perante a nova investida em curso de gente medíocre com nome no mercado – @s professor@s, em especial @s que nasceram ali pela década de 60 e inícios de 70, que andam pelos 45-50 anos e ainda não desistiram de resistir, são para exterminar pelo esgotamento físico e psicológico ou pela humilhação pública. Querem-nos fora da carreira, para dar lugar aos “novos” que ficarão profundamente agradecidos pela “oportunidade”, pelo lugar no quadro, que se espera serem adequadamente desconhecedores do que se passou no sistema de ensino em outras décadas ou que, pura e simplesmente, se estão nas tintas para isso, desde que empurrem os “velhos” borda fora. E borda fora nas piores condições materiais, porque tudo deve ser feito de um modo acintoso.

Conheci gente assim no PS e PSD, os dois partidos que têm liderado a governação nos últimos 40 anos, a que se junta alguma desconfiança do PCP em relação a tudo o que se possa assimilar a “trabalho intelectual” e a concepções menos indiferenciadas do proletariado. O CDS gosta de professores, se forem assalariados no ensino privado, enquanto o Bloco oscila muito, porque há uma grande diferença entre a velha UDP e os urbanitos do PSR e demais plataformas criadas com a queda do Muro de Berlim.

Sim, é verdade, tenho uma tendência esquizóide (a mesma lá de cima) que me faz sentir que a classe docente não tem qualquer aliado natural nos partidos com assento parlamentar permanente (nem falo do PAN, para não ser demasiado sarcástico e dizer que nos defenderão apenas quandoformos assumidamente tratados como animais), o que devolvo com a minha natural animosidade por todas as nomenklaturas que trocam quaisquer princípios “fundadores” por conveniências circunstanciais (sejam de nomeações estratégicas em comissões centrais ou regionais, seja de distribuição de fundos locais e outras tenças com origem europeia).

Sim, acredito que a classe docente não pode ter qualquer esperança numa classe política que se define pela qualidade/mediocridade de quem promove ou dos métodos que usa para anular o poder judicial quando lhe chega aos calcanhares. E muito menos aqueles que, na classe docente, têm idade e ainda têm condições para se lembrar de onde vieram estes velhos jotistas e o que fizeram em verões passados.

O que eles pretendem é domesticar qualquer autonomia dos docentes com capacidade crítica, mesmo quando defendem o “pensamento crítico para o século XXI”. A menos que fiquem caladinhos e sossegadinhos. O “sucesso” e a “inclusão” são apenas para os humildes e amochadinhos. E não perturbem os acordos de bastidores ou pressionem os sindicatos para desalinharem do que estava combinado. E muito menos contestem as “hierarquias”.

Se o fizerem, serão castigados em público e, por acção ou omissão (dos sonsos e hipócritas que dizem que até concordam com as queixas dos professores, mas que “é difícil” satisfazê-las ou fazer qualquer coisa “atendendo às circunstâncias”) pressionados até não aguentarem mais e depois serem apontados como maus profissionais, absentistas ou falsos doentes. Infelizmente, cada vez mais, com a colaboração de kapos locais, inebriados pela insignificância do seu poder na cadeia hierárquica e pela sensação de impunidade.

O Senhor certamente me perdoará a prosa dura no seu dia, pois em nada contraria a sua palavra (Êxodo, 20:16).

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