terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Regressos precipitados ou a negação das evidências?

Uma excelente resposta à carta aberta publicada no Expresso, assinada por um grupo de especialistas e notáveis, onde consta, entre outros políticos ou candidatos a políticos da nossa praça, o nome do presidente da Confap; “Prioridade à escola”: a carta aberta (na íntegra) que apela à reabertura das escolas já em março.
 
Paulo Guinote 

Gostava de deixar bem explícito que abomino este período de ensino à distância ou ensino remoto de emergência. Porque não passa, em muito, de fingimento com as condições ao dispor de alunos e professores.

Os sinais são claros da parte dos especialistas que são chamados a conversas com a nossa elite política no Infarmed. São mesmo mais do que sinais. São recomendações sem grande margem para equívocos. Como num passado recente, quando não foram ouvidas. Agora, são no sentido de manter o confinamento, pelo menos até à segunda metade de Março, mesmo se o Rt desceu de forma significativa.

Mas da parte dos políticos existe alguma ambiguidade, muito em especial quando se trata da reabertura das escolas. Na última semana, quer o ministro da Educação, quer a ministra de Estado e da Presidência, surgiram publicamente a anunciar que o desconfinamento começaria pelas escolas como se isso fosse uma espécie de dogma entre aqueles que há um par de meses consideram impensável o encerramento das escolas e faziam disso uma “linha vermelha” que nunca atravessariam.

Afinal, a realidade atravessou-se e foi necessário dar o dito tão convicto por mera hipótese. Mas parecem ter ficado com esse inconseguimento cravado de forma tão dolorosa que não perdem qualquer oportunidade para nos fazerem saber que as escolas serão, de novo, o laboratório do combate à pandemia. Em especial no ministro da Educação, por mais de uma razão, acho estranha tamanha persistência que em pessoa mais comum se poderia confundir com cega teimosia.

Gostava de deixar bem explícito que abomino este período de ensino à distância ou ensino remoto de emergência. Porque não passa, em muito, de fingimento com as condições ao dispor de alunos e professores. É um esforço que quem está do lado de fora não consegue compreender em pleno, sendo que já sabemos ser escasso o retorno em termos de aprendizagens, em especial no caso dos mais pequenos.

Por mim regressaria já amanhã, se não achasse que isso seria um disparate imenso em termos de saúde pública. Não porque as escolas sejam focos de contágio, até porque nesse aspecto particular a preparação foi feita com bastante cuidado. Porque foi feita localmente e não encomendada tardiamente pela 24 de Julho. As escolas não são aquele estranho oásis de “contágio zero” no meio do caos pandémico, onde flutuam “bolhas” estanques, mas são locais razoavelmente seguros. O problema não é esse e já deveria estar interiorizado o que está em causa.

E o que está em causa é que com as escolas abertas é impossível qualquer estratégia eficaz de redução da mobilidade de uma parcela muito significativa da população. Entre alunos e familiares que os transportam – e o recurso a transportes públicos está longe de reduzir qualquer risco - temos 20-25% da população em movimento todos os dias, pelo menos em dois momentos. Com tudo o que está associado a essa movimentação.

Não compreender isto é negar uma evidência demasiado evidente. Que isso pareça não ser compreendido por quem apresenta currículo de cientista e tem responsabilidades governativas parece-me, no mínimo, peculiar.

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