João Ruivo - Ensino Magazine
O comportamento do nosso ministro da Educação tem continuado a revelar um rumo errático, perfeitamente incompreensível e um estilo de inqualificável desvario ideológico. Ou seja, Crato entrou pelo sistema educativo adentro, como um elefante numa loja de cristais. As consequências…. Vão levar muitos anos a reparar. A grande reforma educativa sorvida dos quentes e vibrantes anos do final da década de sessenta, consubstanciada nas filosofias do Maio de 68, apontava para uma escola aberta, universal, inclusiva, interclassista, meritocrática, solidária, promotora da cidadania e, até, niveladora, no sentido que deveria esbater as desigualdades sociais detectadas à entrada do percurso escolar. Os professores passavam a ser mediadores da aprendizagem, promotores da socialização e do trabalho partilhado. Os alunos metamorfoseavam-se em aprendentes activos, participativos, concretizadores, co-líderes da sala de aula e do rumo a dar às planificações. Os pais, descolarizados ou iletrados, por vergonhosa opção de quatro décadas de ditadura, entregavam os seus filhos naqueles centros de promoção do sucesso social. Era a escola aberta à comunidade, uma escola moderna, que se impunha à escola tradicional. Era, enfim, a escola inclusiva, aberta a todos. Com o decorrer dos anos, os governantes, lá no alto do seu douto saber, entenderam que, já agora, os professores e a escola poderiam também cumprir uma imensidão de funções até então cometidas ao Estado, às famílias e à sociedade. Mesmo que não tivessem tido preparação para isso, os professores tinham demonstrado que sabiam desenvencilhar-se e, sobretudo, que não sabiam dizer não. E desde então, essas passaram também a ser tarefas e funções da escola e dos seus docentes. A partir desse momento singular, passámos a ter uma escola que, por acaso, também era um local de aprendizagem formal, mas que, sobretudo, se foi desenvolvendo como um espaço de aprendizagens sociais, informais, socializadoras. E foi assim que se baralhou e se desvirtuou uma escola que, altruisticamente, queria ser para todos, transformando-a numa escola onde tudo cabia. Era a escola para tudo. Mais recentemente, os últimos responsáveis pelo Ministério da Educação, entenderam que a escola gastava muito e os professores, numa indolência secular, pouco ou nada faziam. Que tinham poucos alunos a quem ensinar; que perdiam muito tempo na sua formação permanente; que davam demasiada importância ao "como ensinar e ao como aprender", em vez de se dedicarem a verificar as aprendizagens memorizadas; que se dedicavam demasiado a combater a exclusão escolar e social; que se envolviam muito com as famílias na educação dos jovens; que desejavam que todos os seus aprendentes estivessem na sala de aula, em comum colaboração, mesmo que alguns deles necessitassem de um apoio especial…. Não bastasse tudo isto, entrou em cena o elefante do "eduquês"… A esta santa alma tudo lembrou, o que ao diabo esqueceu: Aos professores, era exigido que reincarnassem de novo, que procurassem novas profissões. Que comprassem escolas. Que emigrassem. Que percebessem que o nosso sistema de ensino poderia ser muito melhor se acabassem metade das actividades desenvolvidas nas escolas e se se dispensassem cerca de 40 mil docentes. Alias receio que este medonho "elefantês" ainda tem dificuldades em perceber o que fazem e para que servem os professores nas escolas. E tudo isso, infelizmente, não era apenas um pesadelo. Foram as opções de política educativa neoliberal, de que estava ao serviço do sistema financeiro internacional, dos interesses privados, contra o Estado social e, sobretudo, contra os mais desfavorecidos, os quais, por isso mesmo, acabariam por ser os mais prejudicados. De resto, o senhor ministro tem vindo a demonstrar que pouco lhe interessa o impacto negativo destas medidas na implosão da Escola Pública e no comprometimento do futuro do país. O que eles não sabem nem sonham é que os professores têm dentro de si a força regeneradora do saber, da cultura e da utopia social. Modelando sabiamente os seus alunos, são os construtores de futuros. Dentro e fora da escola querem partilhar a discussão do amanhã, porque aprenderam que ter, é ceder e partilhar. Infelizmente, como humanos que são, também erram: do seio da escola por vezes saem maus políticos e, logo, más políticas. Mas não é por isso que se deixam abater, já que exercem uma profissão que exige a reflexão permanente, a busca de consensos, e a capacidade de ser persistente, sem teimosia.
(Negrito e sublinhado nosso)
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