terça-feira, 11 de maio de 2021

Os alunos de hoje precisam de uma Escola que lhes permita ver mais além

Paulo Guinote

Uma Escola que procura ver longe é, por definição, aquela que não se deixa aprisionar pelas modas do
momento e não desenvolve políticas a pensar em objectivos instrumentais de curto prazo.

Confesso que senti uma inesperada atracção pela utilização do conceito de “escola-radar” (não tanto pelo seu significado mas pelo potencial da ideia) e procurei outro tipo de metáforas ou analogias que pudessem aplicar-se à escola de um modo mais próximo do meu pensamento acerca da sua função na sociedade.

O primeiro conceito que me ocorreu foi o da “escola-telescópio”, da Escola que vê ao longe e vai para além das suas circunstâncias e contexto. Da Escola (e por extensão, da Educação) que procura preparar os alunos (mesmo) para o futuro e não usa esse argumento como mero pretexto para colocar em prática medidas desenhadas de acordo com interesses particulares transitórios.

Uma Escola que procura ver longe é, por definição, aquela que não se deixa aprisionar pelas modas do momento e não desenvolve políticas a pensar em objectivos instrumentais de curto prazo. É uma Escola que implica que a governança da Educação não tente confundir-nos ao apresentar políticas feitas à medida deste ou aquele grupo de pressão como se fosse algo “estruturante”. Não pode ser uma governança que apresente como indiscutíveis e inadiáveis decisões que não passam da recauchutagem do que já foi aplicado sem grande sucesso, para satisfação de quem não conseguiu, à primeira ou segunda vez, demonstrar a bondade de conceitos ultrapassados.

Uma escolaridade obrigatória de doze anos não pode nortear-se por princípios vagos e generalistas, que mais não fazem do que dar uma formação adequada à criação de uma massa laboral com baixas qualificações, precária e facilmente manipulável. A falácia do “trabalhador do futuro” ser aquele que está pronto para mudar rapidamente de ocupação, ser flexível nos seus objectivos e se adaptar a novas circunstâncias é apenas o ideal de quem quer mão-de-obra indiferenciada, com baixa capacidade de resistência à desregulação dos horários e à lógica dos baixos salários.

Toda a retórica actual em torno do “espírito crítico” e “empoderamento” dos indivíduos esbarra com uma lógica de currículos definidos pelo menor denominador comum, repletos de banalidades, com conteúdos desarticulados e incapazes de, através da transmissão de conhecimentos sólidos e vastos sobre um conjunto de matérias essenciais, mesmo que alegadamente fora de moda, garantir que as novas gerações de cidadãos estão equipadas para distinguir factos de crenças, de entender que a Ciência é uma narrativa em renovação e não uma Fé cheia de dogmas.

Como Copérnico e Galileu usaram o telescópio para verem mais longe e assim perceberem que a Terra não é o centro do Universo, os alunos de hoje precisam de uma Escola que lhes permita ver mais além e entenderem que o que agora lhes é servido como se fosse um “paradigma” indesmentível, não passa de poeira que esconde mais do que revela o mundo que os espera.

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