Paulo de Morais - Público
Mais
uma vez, em 2019, os grandes grupos económicos irão ser favorecidos com
milhares de milhões, numa dimensão que ninguém imagina.
O
Orçamento do Estado (OE) foi entregue no Parlamento, apresentado publicamente;
mas muitas das suas principais medidas
continuam ocultas da opinião pública. Mais uma vez, em 2019, os grandes
grupos económicos irão ser favorecidos com milhares de milhões, numa dimensão
que ninguém imagina. Em participações de capital irão ser enterrados milhares
de milhões, sem benefícios directos para os cidadãos, e em quantias nunca antes
atingidas.
O
OE de 2019 funciona como um jogo de sombras. A sua maior rubrica é constituída por despesas excepcionais. São dez mil e cem milhões de euros disfarçados,
mais de 10% duma despesa total de cerca de 90 mil milhões. É uma verba superior
ao que se gasta em Saúde, em Educação ou em qualquer outra função primordial do
Estado. As “excepções” consomem, no seu
conjunto, 75% por cento do que se colecta em IRS! Mas, para além de
extra-ordinárias, as despesas são iníquas. São
despesas excepcionais as contribuições para o Fundo de Resolução da Banca,
no valor de mil e setecentos e cinquenta
milhões de euros. Estas transferências constituem um apoio absurdo à Banca.
Este Fundo foi constituído aquando da falência do BES como um contributo do
Estado, que foi anunciado pela então ministra Maria Luís Albuquerque como
irrepetível e recuperável. Foi então anunciado que o Fundo iria ser alimentado
pelos bancos. Pois, contrariamente ao prometido, vamos já no quarto ano em que milhares de milhões dos nossos impostos
são enterrados numa banca perdulária, mal gerida e fonte de inúmeros negócios
corruptos. Para além de contribuir para o Fundo de Resolução Nacional, o
Estado contribui também para mecanismo idêntico, mas de âmbito europeu. Não só
iremos pagar os desmandos dos banqueiros portugueses, como os de igual calibre
em Estados estrangeiros.
No
OE estão também previstas como extraordinárias as participações de capital, que orçam em quatro mil milhões de euros,
representando um acréscimo de 64% face ao ano anterior. A que se soma ainda
uma transferência para a Parpública de
mil e duzentos milhões. Este tipo de gastos vem, aliás, na sequência de
anos e anos de injecções de capital sempre mal explicadas, nas mais diversas
entidades. Assim foi com o aumento de
capital na Caixa Geral de Depósitos em 2017, de cerca de cinco mil milhões,
que até hoje ninguém esclareceu; assim
será em 2019, com montante equivalente.
Além
de jorrar dinheiro a rodos no sector financeiro, além de canalizar fundos para
empresas mal geridas, o erário público
irá também alimentar, com recursos quase ilimitados, os concessionários das
parcerias público-privadas (PPP), muito em particular as rodoviárias. No
próximo ano serão mil e quinhentos
milhões em rendas pelas ruinosas PPP rodoviárias. Esta verba é
pornográfica, já que o valor justo seria de 340 milhões, o montante adequado da
renda, em função de valor actualizado calculado pelo Eurostat-UE. O pagamento
das PPP rodoviárias irá assim reflectir um custo cinco vezes superior ao valor
do activo, à semelhança do que vem acontecendo nos anos anteriores e ao que
está previsto vir a ocorrer nos próximos 18 anos. Só esta rubrica representará um desperdício anual de quase mil e
duzentos milhões de euros.
Estes
são apenas alguns dos inúmeros gastos
perdulários efetuados com o dinheiro dos contribuintes, de forma camuflada, em
2019. Incompreensível é pois o
silêncio duma Esquerda paralisada, com o Bloco de Esquerda e o Partido
Comunista a serem cúmplices da entrega de milhões à Banca e aos concessionários
das PPP; inexplicável é também a conivência
do PSD e do CDS que permitem, mudos e quedos, que o Estado continue a
consumir recursos inimagináveis, sem as respectivas contrapartidas para os
cidadãos contribuintes. E calada está
também a imprensa dita livre, que aceita como válida a narrativa sobre o OE
que a propaganda governamental lhe impinja. Talvez por preguiça (da maioria)
dos jornalistas de Economia, que não lêem as 313 páginas do OE; talvez por
incompetência, porque não sabem interpretar os quadros; ou – pior – porque se tornaram cúmplices dum sistema em
que os grupos económicos manipulam toda a política e (quase) toda a informação.
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