quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Os aparelhos digitais trazem com eles uma nova escravatura e fazem de todo o tempo um tempo de trabalho

No Enxame - Reflexões sobre o Digital é um livro muito interessante e muito atual que analisa o modo como a rápida evolução digital, a internet e as redes sociais estão a transformar a sociedade atual.
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Da Ação ao Teclado

(…) hoje, encontramo-nos livres das máquinas da era industrial, que nos escravizavam e exploravam, mas os aparelhos digitais trazem com eles uma nova coação, uma nova escravatura. Exploram-nos em termos mais eficazes porque, dada a sua mobilidade, transformam qualquer lugar num ponto de trabalho e fazem de todo o tempo um tempo de trabalho. A liberdade da mobilidade paga-se por meio da coação fatal de termos de trabalhar em toda a parte. Na era das máquinas, o trabalho distinguia-se do não-trabalho pela imobilidade das máquinas. O local de trabalho, até ao qual tínhamos de nos deslocar, podia separar-se com facilidade dos espaços de não-trabalho. Na atualidade, em grande número de profissões, essa delimitação foi suprimida. O aparelho digital torna móvel o próprio trabalho. Cada um de nós leva consigo de um lado para o outro o posto de trabalho numa espécie de regime de campanha. Já não é possível escaparmos ao trabalho.

Os smartphones, que prometem mais liberdade, exercem sobre nós uma coação fatal – isto é, a coação de comunicar. Entretanto, a nossa relação com o aparelho digital torna-se quase obsessiva, compulsiva. Também aqui, a liberdade se transforma em coação. As redes sociais reforçam maciçamente esta coação da comunicação, que, em última instância, resulta da lógica do capital. Mais comunicação significa mais capital. A circulação acelerada da comunicação e da informação conduz a uma aceleração da circulação do capital.
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... A era digital totaliza o aditivo, o calcular e o enumerar. As nossas próprias preferências são calculadas pela contagem do número de "Gostos". A narrativa perde grande parte da sua importância. Tudo se torna hoje enumerável, a fim de ser possível contá-lo na linguagem do rendimento e da eficácia. Por isso, hoje, tudo o que não se pode contar numericamente deixa de ser
Byug-Chul Han, No Enxame – Reflexões sobre o Digital 
(Pág. 46 e 47)

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