António Fernando Nabais
A melhor escola do país é aquela em que os alunos não são selecionados à entrada (por imperativos legais que, por coincidência, também são éticos), em que os alunos não são convidados a sair porque as notas baixaram (mais uma vez, por razões legais e éticas, extraordinária coincidência), em que os alunos são mantidos dentro da escola e das aulas, à custa do esforço e do risco de funcionários e de professores que falam, exigem, discutem, abraçam, debatem, convencem, vencem, sentindo-se frequentemente derrotados.
A melhor escola do país é aquela em que se consegue que um aluno assista a mais uma aula, que pegue finalmente num caderno mesmo que se recuse a escrever, que se esqueça, por instantes, de que tem o pai na prisão, a mãe a drogar-se em casa e os irmãos sozinhos, entre uma galáxia de problemas que afectam qualquer ser humano que é obrigado a perder inocência demasiado cedo ou que não tem a mínima possibilidade de estar isolado no luxo de um quarto individual.
É a escola em que se consegue que um aluno assista, pela primeira vez, maravilhado, a uma peça de teatro, ou que o leve, pela primeira vez, a visitar uma cidade (que pode ser aquela em que vive e não conhece) ou que o leve a entrar, pela primeira vez, num palácio tão espetacular que chega a parecer estrangeiro, o que faz sentido porque, em tantas vidas de tantos alunos, a beleza, a cultura ou o conhecimento são bens estrangeiros sujeitos a taxas alfandegárias proibitivas.
É a escola em que os professores e os funcionários conseguem ultrapassar o natural ódio que suscita uma criança malcriada, desafiadora, desagradável, dando-lhe tudo aquilo que ela não quer ou acredita que não quer, o que acaba por ser o mesmo. Sim, é possível odiar crianças e não, não é aceitável (mesmo que seja provável) que isso possa afectar a dedicação de quem trabalha com ela.
Na melhor escola do país, os que lá trabalham sabem que os pobres não nascem menos inteligentes, mas sabem que a inteligência ou as inteligências pode(m) sofrer atrofias várias com tanta coisa que a falta de dinheiro pode implicar. Nessa escola, saber isso funciona como explicação para muitos insucessos, embora muitos procurem que nunca sirva de desculpa para se fazer menos.
A melhor escola do país é aquela em que os resultados dos exames são tão fracos que a classificação nos rankings pode causar problemas de consciência a quem fez tanto ou mais do que nas escolas que ficaram nos primeiros lugares. Os que trabalham nestas escolas ouvem e lêem as declarações dos pedagogos de sofá que explicam tudo sem nunca ter dado aulas, ouvem e lêem os diretores das escolas de topo (públicas ou não) afirmar que os resultados se devem a uma cultura de exigência e uma dedicação extraordinária do corpo docente, como se isso constituísse uma exclusividade tão rara como uma ilha de um metro quadrado no meio do Pacífico.
Na melhor escola do país, os problemas de consciência duram os poucos segundos que o intervalo da frustração provoca na necessidade de voltar ao trabalho, porque, na melhor escola do país, trabalha-se para os alunos e não para os rankings.
As outras escolas, em que os alunos querem aprender e/ou tiram belíssimas notas nos exames, também são boas, mas não conseguem chegar a ser a melhor escola do país.
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