sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Como a incapacidade é muita, apagam o fogo com mais lenha para a fogueira


Quando julgava não ser mais possível o género humano superar-se na asneira, assim aconteceu...

Aos professores tudo se exige, desde formação especializada a formação contínua, a avaliação humilhante, horários de trabalho selvagens e responsabilidades acrescidas para colmatar as enormes falhas de uma sociedade irresponsável. Mas, depois, propõe-se que, com o maior dos facilitismos, se conceda a qualquer cidadão diplomado o direito a ser professor.

Mas, vindo de quem vem, não seria de esperar outra coisa. Quando se acha que alguém que nada tem a ver com o ensino nem percebe de Educação pode ser Ministro da Educação, não seria de estranhar que o mesmo considerasse natural pôr a dar aulas alguém que nada tivesse a ver com o ensino. Esta é a cereja em cima do bolo na passagem pelo ME de um ministro ausente, porque, veja-se só, o seu tempo não chegava para saciar uma certa e desmesurada afeição por desporto.

Mas, o mais caricato é que a solução está ao alcance do olhar de todos. Se tratasse melhor e condignamente os que cá estão (no ensino) em vez de ir buscar licenciados para tapar os buracos que abriu, a coisa resolvia-se num instante. Haveria menos professores a abandonar a profissão, ou a pedir a reforma antecipada, e haveria mais jovens a quererem ser professores.

Assim, como a incapacidade é muita, apagam o fogo com mais lenha para a fogueira. Num sistema repleto de professores desmotivados e exaustos pela sobrecarga de trabalho – sobretudo burocrático –, envelhecidos pelo enorme afastamento da idade para a reforma, mal pagos, sem nenhumas ajudas de custo e nómadas – fruto da instabilidade profissional –, vão querer acrescentar pessoas que nada têm a ver com a Educação que, na ausência de outro rendimento, virão para as escolas vender aulas ao baixo custo a que são pagas.

No meio de toda esta insensatez, perdem os alunos nas suas aprendizagens.

Mas o que interessa isso a gente que não entra numa sala de aulas há décadas, nada percebe sobre aquilo que se passa nas escolas e sobre a atividade profissional de um professor?

Só é de lamentar que os pais – sobretudo, quem os representa –, contrariamente ao que sucedera noutras ocasiões em que se punham logo na primeira fila para a tirar a primeira pedra os professores, agora estejam tão calados perante tamanha aberração; pessoas que serão tão responsáveis pela degradação do ensino e da educação dos seus filhos, quanto os políticos que cegamente seguem.

O delírio é tanto, achando que qualquer um pode ser professor, que em breve todo o edifício escolar construído por todos ao longo de décadas acabará por ruir na mediocridade em que se transformará a educação em Portugal.

Mas, a rigor, há que perceber que todos estes que fazem currículo (e trampolim) às custas dos títulos de estado que envergam, não lhes interessa o modo como deixam ficar desarrumada a casa da educação depois de por lá passarem.

Se o ministro realmente existisse, teria entendido qual o verdadeiro motivo de estar a agigantar-se o problema há muito anunciado da falta de professores; já teria admitido estar a ser altamente prejudicial à sanidade física e mental a sobrecarga de trabalho e a falta de autoridade e a dignidade retirada aos docentes; teria visto que existem professores que pagam para trabalhar, fruto das deslocações diárias ou das rendas de uma segunda casa nas terras onde são colocados; teria compreendido que a promessa de baixos salários agravados pela perda de quase 30% do poder de compra nos últimos 12 anos, afastaria os candidatos a uma vida penosa e mal paga; já teria percebido que, hoje em dia, só um insano opta por uma carreia que o atirará para longe da sua família durante décadas, com despesas de contexto avultadas, em troca de um salário indigno que, para um professor em início de carreira, já pouco difere do salário mínimo e que, para muitos professores contratados, descontando as despesas, fica abaixo do limiar da pobreza. Mas como a única pobreza dos nossos estadistas é apenas a de espírito e o nível de desconhecimento maior ainda, no meio de tanta incompetência, não tendo ainda conseguido destruir o ensino com a doença que espalharam, vão agora tentar acabar com ele com a cura que anunciam.

Em todo o caso, seria de uma enorme desonestidade intelectual atribuir todas as culpas ao ministro pela sua inoperância ou pela atividade errante, pois os seus antecessores não foram menos brilhantes na tarefa de arruinar a educação.

Só é de lamentar que sejam poucos aqueles que se aperceberam que o inexcedível espírito de sacrifício e de entrega dos professores foi o responsável pela sobrevivência da escola pública e pela melhoria da instrução de uma população, outrora, quase analfabeta. Só é pena terem falhado na formação de alguns…

Alguém, em tempos, dissera ser triste a nação onde um dia seja mais bem pago um advogado do que um professor. E não é preciso ter olho clínico para encontrar nos nossos noticiários o estado calamitoso e imoral a que chegou uma nação recheada de advogados atarefados a salvar bandidos e de professores a passar mal para conseguirem exercer a sua profissão.
(Negrito nosso)

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